Fé, a Mãe da Pós-verdade

Muito se fala hoje em dia em "pós-verdade". Mas o que ninguém reparou é que a pós-verdade nada mas é do que a fé transposta para assuntos não religiosos. Melhor: é a fé aplicada em nosso cotidiano. É quando tratamos os fatos de nosso cotidiano da mesma forma que tratamos os dogmas religiosos, permitindo que a realidade seja refutada em troca dos absurdos que nos confortam.

A própria definição de pós-verdade é a mesma definição da fé: situação em que as convicções pessoais de cada um são mais importantes que os fatos. O modo como a pessoa enxerga o mundo passa a substituir a compreensão lógica dos fatos, permitindo que absurdos sejam aceitos como verdades.

A própria fé religiosa tem muito de pós-verdade. mesmo a crença em Deus e em Jesus tem muito a ver pois nenhum dos dois até hoje tiveram a sua existência comprovada. Principalmente Deus, já que é um absurdo que tudo que existe na realidade corresponda ao controle e aos interesses de uma só pessoa, que governa tudo escondido no universo.

Mas para a maioria das pessoas, Deus é real, Jesus não só foi personagem histórico como ainda age hoje em prol da humanidade e muitos dogmas religiosos são reais, por mais ilógicos e surreais que possam parecer. Mas a fé é mais importante que a racionalidade. Assim absurdos se consagram.

Acostumados a não pensar, por estímulo religioso, as pessoas começam a aceitar a realidade de forma irracional, preferindo acreditar em absurdos sem verificar. Por isso que fortalece o mito da Terra Plana, mesmo com os rápidos avanços da ciência. 

Mas como a ciência está sempre em mutação, pela sua natureza progressista, isso não a torna confiável diante dos olhos dos mais crédulos, que esperavam que a ciência fosse uma doutrina fechada, com teses já fixas, definitivas. Como é a religião, cujos dogmas são fechados e sem possibilidade de qualquer tipo de alteração.

Sendo doutrinas fechadas, as religiões atraem mais confiança da humanidade que, pela lei do menor esforço, se recusa a pensar. E nem precisa apresentar provas, pois não se exige prova daquilo que está "previamente comprovado", o que faz da fé uma forma mais aceita de verificação do que a razão.

Então, aplica-se a fé no cotidiano também em assuntos não-religiosos. Se a Terra é Plana, acreditemos que sim, mesmo que as provas da "sempre duvidosa" ciência digam o contrário. Isso também se dá a inúmeras crenças defendidas pela humanidade. Se faz bem acreditar, para quê contestar?

Os vários tipos de pós verdade (fake news, wishful thinking, etc.) carregam os aspectos da fé religiosa em seu teor semântico. Para muita gente, a ciência não é sentimental, não valoriza a natureza humana, é dura, ideologicamente flexível e não tem a manor graça para a grande maioria de seres humanos. A fé, pelo contrário, satisfaz os instintos humanos de forma esperada.

Ou seja, a pós-verdade é a consagração da fé religiosa nos assuntos laicos e profanos. Com a religiosidade aprendida através dos "enviados de Deus, o dono do universo", aprendemos a não pensar, a não verificar e a acreditar em qualquer absurdo transmitido por uma fonte que consideramos confiável. Pois acreditar não exige esforço e traz conforto. Por mais absurdas que as crenças pareçam.

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