A mania dos brasileiros de canonizar personalidades quando falecem

Sempre que morre uma pessoa famosa ou um conhecido de alguém, somos bombardeados por elogios homéricos em relação a esta pessoa, como se o então recém-falecido fosse o melhor ser humano da face da Terra, com qualidades que beiram o surrealismo de tão exageradas. Até pessoas de caráter duvidoso - ou mesmo perversas - não escapam daquilo que podemos chamar de "canonização de personalidades".

Agora, vemos o fato acontecer com a cantora Marília Mendonça, vítima recente de um acidente aéreo sem sobreviventes. Logo em seguida, nas redes sociais, a cantora, uma das piores da atualidade, com voz irritante e músicas cheia de defeitos, de repente virou algo genial, uma revolucionária. Só se o fato de ter voz de taquara cantando musicas mal arranjadas com péssimas letras, for considerado "revolução".

Mas choveram elogios surreais á cantora recém-falecida. Os tais elogios chagaram a tal ponto que, se não citarmos o nome, parecia que estávamos falando sobre a Elis Regina, Elizeth Cardoso ou sobre Silvia Telles. Não. Estávamos falando sobre a Marília Mendonça, que de péssima cantora, virou um rouxinol só porque bateu as botas em algum lugar.

Para muitos brasileiros, e isso é algo bastante cultural em nosso povo, morrer é em si uma canonização. Crentes que defeitos são mundanos (como se não fizessem parte da personalidade de uma pessoa, ficando junto com o corpo embaixo da terra), brasileiros pensam que com a morte, só as qualidades permanecem e a pessoa segue para o céu prestes a ser recebido com glórias.

É muito chato para quem é mais racional observar atitudes de histeria explícita em que qualquer Zé Mané vira uma divindade só porque morreu. Mesmo que em nada tenha contribuído para o desenvolvimento e bem estar da humanidade, é tratado como se tivesse contribuído para isso, mesmo sendo o mais ganancioso dos empresários.

Isso no fundo sinaliza o nosso medo enrustido da morte. Não a morte em si, pois vivemos sempre nos arriscando (até porque temos mais medo da solidão do que da morte), mas do mistério que está escondido atrás dela. Acostumados com filmes de terror, já tratamos de elogiar os mortos com medo de que eles voltem para nos assombrar. O elogio serve para que os mortos evitem se zangar conosco.

Mas de qualquer forma é patético ver esses elogios, mesmo que o morto mereça o nosso respeito - mesmo não gostando dela, ficamos tristes com a morte de Marília por ser uma pessoa tão jovem - ainda mais quando o morto em questão nada fez de realmente significativo para a evolução da humanidade. Ainda mais no entretenimento, algo que nem deveria ser levado muito a sério.

Fica aqui a impressão de medo, histeria e fanatismo em relação ao morto. Uma mistura homogênea desses três sentimentos. Uma forma de que ainda continuamos como os seres mais primitivos, com um secreto fascínio pela morte, resultante de nosso apego a fé irracional que nos impede de pensar.

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